Long Distance Call
2021
A instalação interativa Long Distance Call (278 caminhos submarinos para dizer adeus) surge de uma investigação sobre os modos como a comunicação se dá hoje: através da internet, enquanto dados flutuantes que circulam sem parar por 278 cabos submarinos ao redor do mundo. Os primeiros cabos submarinos foram estabelecidos na década de 1850, para o tráfego de telegramas; hoje, já ligam todos os continentes da Terra, exceto a Antártida. São colocados no relevo oceânico, entre estações terrestres, e interconectam pessoas, culturas, e territórios, sem nenhuma aparente fronteira física ou maneira de interromper tal conexão. Mas, e se um tubarão morder um cabo? A ligação no zoom cai. O sinal está fraco hoje, deve ser o vento. Ou a chuva. Ou, melhor, a fome do animal que viu na fibra óptica seu alimento. Assim, traça-se uma relação direta entre as falhas audíveis que acometem o ambiente de comunicação virtual – chamadas de voz e vídeo que caem, o telefone que emudece – e os misteriosos acontecimentos do mundo submarino, dos recorrentes tremores do assoalho à flora e fauna que ali habitam.
Considerando estas interferências, é possível perguntar: quanto estamos verdadeiramente conectados? Talvez a rede que se tece seja maior do que pensamos: a estabilidade de minha ligação depende de todo um ecossistema equilibrado... Então as quedas, cortes, ecos, os entraves de uma linguagem falhada, também possa ser considerado uma tradução desse meio-ambiente em violenta devastação. Todavia, contamos com 278 caminhos submarinos para tentar dizer adeus, ou bom dia, ou estava com saudades de ouvir a sua voz. E sob essa inconstância do comunicar (ampliada por estes dois anos de isolamento social), lembro-me de uma brincadeira de criança, em que estendíamos duas latas vazias de leite condensado conectadas por um barbante até dar tensão, para então, falar. Oi, tudo bem? Tudo, e você? Melhor agora. O chiado do processo analógico, da conversão de ondas sonoras em mecânicas, o riso e às vezes o não entendimento. A incompreensão e o ruído como premissa para uma comunicação fluida, em contraponto com a clareza e estabilidade que se espera de uma conexão digital. Todo um outro sentido da fala e da escuta: uma única linha, duas mãos, o tempo presente. Mas se estendêssemos um barbante do Brasil ao Japão não teríamos voz, só linha. Então talvez imaginar um outro estrato, este onde os cabos submarinos são fios de barbante e as ligações distantes compartilham um mesmo gramado: sobreposições de modos e velocidades do falar para uma rede mundial mais afetiva.
Interessa, assim, para a constituição deste trabalho, dois elementos centrais levantados durante este processo de criação e pesquisa: 1. a espacialidade conectiva entre países - gerada pelos cabos -, e entre pessoas – gerada pelas latas -; e 2. a voz e os ruídos que a atravessam durante uma comunicação. Partindo de um mapa mundial da rede de cabos submarinos, seis placas de madeira são entalhadas a fim de que os continentes possuam relevo e o oceano se forje no negativo. Cria-se um mapa desconstruído e deformado, dividido em seis partes, que formam um tríptico no chão. Em cada placa são marcados seus respectivos pontos de conectividade, previamente indicados no mapa original, através da colocação de pequenos pregos. Estes pregos são ligados entre si por finos barbantes, que reproduzem os cabos submarinos e as conexões entre os países. Como as placas formam um tríptico, e o mundo está deformado, criam-se conexão entre pontos (pregos) imaginárias e longas. Ao lado do tríptico, quatro latas de leite-condensado se interconectam por barbantes, formando dois telefones-de-lata para quatro pessoas interagirem livremente. O público, quando não utilizando o telefone-de-lata (é necessário tensioná-las para poder falar/ouvir), pode aproximar-se do tríptico, para melhor observar seus detalhes.
Em suma, a instalação interativa Long Distance Call (278 caminhos submarinos para dizer adeus) propõe uma outra dinâmica de conexão entre pessoas, recuperando a voz da virtualidade e atualizando-a no plano físico. Imaginar possiblidades comunicacionais que se estabelecem na falha, no ruído e na interferência, para então tecer uma rede presente mais rica e plural.
Foi apresentada na exposição individual Microerosões (2021), na Galeria Refresco (RJ).
The interactive installation Long Distance Call (278 submarine paths to say goodbye) arises from an investigation into the ways in which communication takes place today: through the internet, while floating data that circulates non-stop through 278 submarine cables around the world. The first submarine cables were laid in the 1850s for telegram traffic; today, they already link all of the Earth's continents, except Antarctica. They are placed in the oceanic relief, between land stations, and interconnect people, cultures, and territories, without any apparent physical boundary or way to interrupt such connection. But what if a shark bites a cable? The zoom link drops. Signal is weak today, must be the wind. Or the rain. Or, rather, the hunger of the animal that saw its food in the optical fiber. Thus, a direct relationship is drawn between the audible failures that affect the virtual communication environment – voice and video calls that drop, the telephone that goes silent – and the mysterious events of the underwater world, from the recurrent tremors of the floor to the flora and fauna. who live there.
Considering these interferences, it is possible to ask: how much are we truly connected? Perhaps the network that is weaved is bigger than we think: the stability of my connection depends on an entire balanced ecosystem... So the falls, cuts, echoes, the obstacles of a failed language, can also be considered a translation of this medium environment in violent devastation. However, we have 278 underwater paths to try to say goodbye, or good morning, or I missed hearing your voice. And under this inconstancy of communication (amplified by these two years of social isolation), I remember a child's game, in which we held out two empty cans of condensed milk connected by a string until there was tension, and then we could talk. Hey, how's it going? Everything, and you? Better now. The hiss of the analog process, of the conversion of sound waves into mechanical ones, laughter and sometimes not understanding. Incomprehension and noise as a premise for fluid communication, in contrast to the clarity and stability expected from a digital connection. A whole other sense of speaking and listening: a single line, two hands, the present time. But if we extended a string from Brazil to Japan, we would not have a voice, only a line. So maybe imagine another stratum, this one where submarine cables are strings and distant connections share the same lawn: overlapping modes and speeds of speech for a more affective global network.
Therefore, for the constitution of this work, two central elements raised during this process of creation and research are of interest: 1. the connective spatiality between countries - generated by cables -, and between people - generated by cans -; and 2. the voice and the noises that pass through it during communication. Starting from a world map of the submarine cable network, six wooden plates are carved so that the continents have relief and the ocean is forged in the negative. A deconstructed and deformed map is created, divided into six parts, which form a triptych on the floor. On each plate, their respective connectivity points are marked, previously indicated on the original map, through the placement of small nails. These nails are linked together by thin strings, which reproduce submarine cables and connections between countries. As the plates form a triptych, and the world is deformed, connections are created between imaginary and long points (nails). Next to the triptych, four cans of condensed milk are interconnected by string, forming two canned telephones for four people to interact freely. The public, when not using the tin telephone (it is necessary to tense them to be able to speak/listen), can approach the triptych, to better observe its details.
In short, the interactive installation Long Distance Call (278 underwater paths to say goodbye) proposes another dynamic of connection between people, recovering the voice of virtuality and updating it on the physical plane. Imagining communication possibilities that are established in failure, noise and interference, to then weave a richer and more plural present network.
It was presented in the solo exhibition Microerosões (2021), at Galeria Refresco (RJ).